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Roda de Conversa: O Exame Criminológico voltou a ser obrigatório. E agora?

No dia 13 de março a AASPSI Brasil realizou a Roda de Conversa: O Exame Criminológico voltou a ser obrigatório. E agora? A ideia do debate surgiu em outra roda realizada pela Associação em novembro e que teve como tema o Serviço Social no Sistema Prisional. Naquela ocasião, falamos sobre os principais pontos da Resolução N° 36/2024 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), que regulamenta a Lei 11348/2023, que tornou o exame criminológico obrigatório para a progressão da pena.

Pensando em aprofundar a temática, organizamos a nova roda que contou com a participação de assistentes sociais e psicólogas/os de vários estados. Desta forma, foi possível dialogarmos um pouco sobre como está sendo implantada a resolução pelas Secretarias Estaduais de Administração Penitenciária pelo país e se a resolução está sendo respeitada.

Participaram dos debates a diretora da AASPSI Brasil, Newvone Ferreira da Costa, a assistente social e membro do Conselho de Especialistas, Elisabete Borgianni e o assistente social associado, Kalil Lauar. A mesa foi mediada pela diretora Janaina Holanda.

A resolução

Elisabete falou sobre como foi compor o Grupo de Trabalho que elaborou a resolução, sob a coordenação do professor e advogado Mauricio Stegemann Dieter e a importância do documento para o Sistema Prisional. O GT foi composto pelo coordenador, dois juízes, um promotor, uma assistente social, uma psicóloga e pelos dois conselhos profissionais: CFESS e CFP. A preocupação principal era criar diretrizes para um exame criminológico possível com ênfase no que não pode ser feito: prognóstico de periculosidade; prognóstico de comportamento e de reincidência.

Ela destacou a importância da participação do Serviço Social e da Psicologia neste processo. “Com esta resolução, conseguiu-se resgatar o posicionamento dos dois conselhos desde o início da Lei de Execução Penal (LEP): a de que assistentes sociais e psicólogas/os não fariam prognóstico de periculosidade e comportamental”.

Garantia de direitos

“O exame criminológico é a garantia de direitos das/os usuárias/os, que são as pessoas encarceradas”, lembrou Newvone ao pontuar que a Associação está preocupada com os relatos de não cumprimento da resolução em alguns estados. Para ela, a não realização do exame criminológico vai transformar o estado ainda mais punitivista do que já é.

Ela explicou que geralmente a desculpa é a de que faltam profissionais. “Não nos interessa se não tem profissionais. Isso é problema do governo do estado, que façam concursos públicos ou contratem efetivamente”, defendeu. “O que não pode ocorrer é o que está acontecendo no Rio de Janeiro, por exemplo, que são duas ou três unidades prisionais para um/a assistente social. Assim, não vai ter um bom trabalho e a garantia de direitos é função precípua da/o assistente social”.

Newvone também informou que a AASPSI Brasil está articulando a realização de uma audiência pública nacional para tratar, entre outras questões, do déficit de profissionais do Serviço Social e da Psicologia no Sistema Prisional.

Retomada da LEP

Kalil fez um breve histórico do exame criminológico desde sua concepção na LEP, que determinava que ele deveria ser realizado no início da pena. A lei também estabelecia a criação de “centros de observação criminológicos”. As pessoas privadas de liberdade primeiro permaneceriam nestes centros e uma equipe (a legislação não determina qual) faria a observação e o EC. Após este diagnóstico, se determinaria o local de cumprimento da pena. No final do cumprimento da pena, haveria um parâmetro de comparação entre o EC e o parecer da Equipe Técnica de Classificação. “Mas, estamos no Brasil e aqui as coisas não funcionam. Os centros não ocorreram ou foram experiências pontuais em alguns locais”, lembrou.

Desta forma, o exame criminológico acabava não sendo realizado no início da pena e não havia sentido fazê-lo no final. Em 2003, por força da demanda e do lobby político, em especial do Estado de São Paulo, a exigibilidade do EC foi extinta. No entanto, o Judiciário tinha autonomia para solicitar o exame. E assim foi, até a atual alteração legislativa que voltou com a exigência do EC para a progressão da pena.

Ao longo do tempo criou-se uma “roupagem” para o exame criminológico que é visto pela maioria como uma avaliação que não seria feita no início e sim mais adiante para a liberdade e teria que trazer um prognóstico de periculosidade e reincidência. “Cada estado realiza de um jeito, mas nada está correto. E muitas vezes, as/os assistentes sociais e as/os psicólogas/os embarcam nesta onda sem exercer uma reflexão da construção histórica do processo”, expôs.

 

Sobre o(a) autor(a) Ana Carolina Rios

Jornalista pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), bacharel e licenciada em letras pela Universidade de São Paulo (USP). Assessora de Comunicação da AASPSI Brasil desde 2012.