Dificuldades para execução, cortes orçamentários, número de crianças abrigadas e adoção foram alguns dos pontos abordados

No último dia 27 de setembro, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) exibiu em suas redes sociais mais um programa Diálogo Digital. O tema desta edição foi “Direito de crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária”. O debate contou com a participação de Maria Conceição Ferreira Barbosa de Melo, membro do Fórum Nacional DCA e da Coordenação do Fórum DCA/PE, articuladora e orientadora pela Fundação Abrinq do Prefeito Amigo da Criança/PE; integrante do Núcleo Gestor da Escola de Conselhos/PE; conselheira Estadual da Assistência Social e CEDCA/PE e conselheira do CMDCA. Também foi convidada a participar Andrea Esmeraldo, coordenadora da Proteção Social Especial do município de Maracanaú e professora da Faculdade Kurios; compôs o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Fortaleza – COMDICA e compôs o colegiado do Conselho Estadual da Assistência Social e o Fórum Estadual de Trabalhadores da Assistência Social, representando o CRP 11. O debate foi apresentado e conduzido pela psicóloga clínica e social, Cleia Cunha, coordenadora da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP-8), no período de 1999 a 2009 e conselheira eleita do Conselho Federal de Psicologia, gestão 2017-2019.
“O Plano de Convivência Familiar e Comunitária tem uma história. Ele foi resultado de um processo participativo, que envolveu todos os Poderes e esferas do governo, sociedade organizada e organismos internacional, em meados de 2003”, iniciou Cleia. “O Plano constituiu o primeiro marco de política pública no Brasil ao romper a cultura de institucionalização de crianças e adolescentes e ao fortalecer o paradigma da proteção integral e a preservação dos vínculos familiares e comunitários, fundamentais para a constituição de crianças e adolescentes como sujeitos e cidadãos”, completou.
“O Plano foi pensado como uma política intersetorial, foi pensado para que possamos trabalhar com o foco social das famílias e não especificamente de crianças e adolescentes. O objetivo principal é minimizar a violação dos direitos humanos de crianças e adolescentes e das famílias”, expôs Conceição. “Ele traz coisas que são muito caras tanto para a política de assistência como para a política da criança e do adolescentes e o plano é inovador porque ele traz um conceito de família que não se constrói exclusivamente a partir dos vínculos biológicos. É um conceito que abrange as diversas formas de família, tira a ideia de que existe uma estrutura única de família”, complementou Andrea.
Provocar a sociedade para mudanças
De acordo com Conceição, o Fórum DCA está preocupado com a não efetivação do Plano e pensou em formar uma comissão com diversos atores dos fóruns estaduais para “que possamos revisitar o que avançamos, o que não e como vamos propor um documento para apresentar ao Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) e ao CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social)”. Ela comentou que foram encaminhados questionários para que o Fórum possa mapear como está a efetivação dos planos estaduais e saber os estados que ainda não têm este plano. “O foco é justamente trabalhar a questão intersetorial para proteção das famílias e suas crianças e adolescentes”, apontou.
Cortes orçamentários
Andrea abordou a delicada questão dos cortes orçamentários para a política de assistência social. “Ano passado tivemos um corte muito drástico e o projeto orçamentário anual que está em discussão prevê novamente um corte no entorno de 50% de recursos para a política de assistência social”, denunciou. “Isso reflete na oferta dos serviços sócio assistenciais, na ausência de equipes técnicas nos Cras (Centros de Referência de Assistência Social), na ausência de estrutura nestas unidades e isso faz com que a convivência familiar e comunitária seja restringida”, disse. Esta conjuntura torna-se mais dramática quando pensamos nas características diversas das diferentes regiões do país. “Eu estive em lugares que para você fazer uma visita domiciliar, você precisa passar três horas em um barco. É preciso ter estrutura para dar conta dos serviços sócio assistenciais”, explicou Andrea.
Aumento da institucionalização e adoções
“Eu trouxe um dado em relação à adoção que considero alarmante. Em 2017, tivemos 158 crianças e adolescentes adotados. Sabemos que a procura de famílias estrangeiras tem aumentado muito. De 2015 pra cá, 150 brasileiros foram adotados por estrangeiros”, apontou Conceição. Para ela, a não implementação do plano e os cortes orçamentários são fatores determinantes para o número de crianças abrigadas. “Falta trabalharmos na questão da prevenção, do investimento nas políticas, da intersetorialidade, aí poderíamos ir além da questão do abrigamento e d adoção. Trabalharíamos efetivamente protegendo estas famílias”, alegou. Ela alerta para o fato de que a maioria dos abrigados ou que estão disponíveis para a adoção são de famílias em situação de vulnerabilidade extrema e negros e, suas famílias, não foram inseridas nos programas e serviços que deveriam.
Andreia também abordou estatísticas para reflexão. Em dezembro do ano passado o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) lançou alguns dados que diziam existir 42 famílias inseridas no cadastro nacional de adotantes e mais de 8 mil crianças e adolescentes em condições de serem adotadas. “Algumas pessoas podem fazer uma matemática e dizer: se tem 42 famílias e oito mil crianças, não basta fazer uma soma e resolver? Mas a questão não é de quantidade. Nós temos é que mudar a pergunta: por que temos tantas crianças em situação de acolhimento e por que temos tantas crianças disponíveis para a adoção”, defendeu.
Estas foram algumas das questões abordadas durante o debate. Não deixe de assistir à gravação completa disponível no canal do Youtube do CFP