O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) instituiu o Protocolo CIJ Nº 00066030/11 (Diário Oficial de 30 de maio de 2011), que regulamenta a execução do “Depoimento Especial” ou “Escuta Especial”, cuja implantação vem sendo recomendada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Foi também promulgada a Lei 13.431 de 4 de abril de 2017, na qual esta metodologia é estabelecida como prática a ser adotada pelo Judiciário.
A “Escuta Especial” é a inquirição judicial da criança intermediada por um “profissional especializado” (no TJ-SP, essa função tem sido atribuída aos assistentes sociais e psicólogos), realizada em sala separada e interligada à sala de audiência por meio de áudio e vídeo. Durante essa inquirição, o profissional deve transmitir para a criança os questionamentos que o juiz considerar pertinentes para obter informações necessárias do julgamento do suposto agressor.
Entretanto, essa metodologia tem sido amplamente discutida entre os profissionais de diversas áreas do conhecimento, produzindo-se estudos e posicionamentos contrários. A criança vítima de violência física, psicológica e, especialmente, sexual, sendo obrigada a responder perguntas sobre o vivenciado, é mais uma vez vitimizada e desrespeitada, recaindo sobre ela a responsabilidade de produção de provas, desconsiderando-se os danos causados por esse tipo de abordagem.
Diversos estudos científicos demonstram a inadequação de usar de forma direta a memória traumatizada de uma criança para produzir provas. A idade e a fase de desenvolvimento neuropsicológico influenciam na forma como a memória se estabelecerá e como a criança se expressará, não sendo seguro considerar a fala dela, necessariamente, como uma representação exata da realidade. Muitas vezes a criança não é capaz de discernir claramente (do ponto de vista lógico linear) o que viveu, bem como verbalizar de acordo com a expectativa da linguagem e raciocínio do adulto. Essa diferença de desenvolvimento, linguagem e capacidade de simbolização podem levar a confusões na significação de fatos vivenciados.
Além disso, são observados casos de implantação de falsas memórias (nos casos de alienação parental, por exemplo). Nestas situações, a fala da criança poderá propiciar a condenação de um inocente. Os danos presentes e os prováveis danos futuros são imensuráveis.
A despeito de todos os questionamentos, e dos pareceres dos Conselhos de Serviço Social e de Psicologia, esta metodologia vem sendo implantada.
É defendido o investimento em recursos humanos e ampliação das equipes técnicas especializadas para realização de estudos psicológico e social com a criança e familiares, analisando as relações, comportamentos e demais indícios surgidos nos diferentes âmbitos (escola, relatos de profissionais dos serviços de saúde, etc.). A avaliação especializada oferece uma visão mais precisa e cuidadosa da situação, sem desconsiderar a necessária proteção da criança.